Motorista recebe indenização por falta de treinamento de segurança pela empresa, e acaba portando bens de valores
Um motorista de empresa de bebidas foi reconhecido como tendo direito a indenização por danos morais pela atribuição de receber pagamentos e guardar dinheiro no cofre do caminhão, sem ter passado por treinamento específico para essa atividade. A 4ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho justificou que o empregado, cujo dever não é zelar pela segurança patrimonial do empregador, foi submetido a estresse e pressão psicológica decorrentes dessa tarefa, o que caracteriza dano moral. A decisão unânime dos juízes manteve, nesse sentido, a sentença proferida pela juíza Daniela Meister Pereira, da 1ª Vara do Trabalho de Porto Alegre, apenas reduzindo o valor fixado para a indenização de R$ 9.750 para R$ 5 mil.
De acordo com a ação, o motorista trabalhou para a empresa de agosto de 2014 a fevereiro de 2018. Além de transportar e entregar as bebidas, era responsável por receber os pagamentos das mercadorias, em dinheiro ou por meio de boletos. Em média, os valores eram de R$ 15.000 por dia, com pagamento médio em dinheiro de R$ 2.000 a R$ 4.000, que ficava guardado no cofre dentro do veículo. Durante o exercício das atividades, o funcionário sofreu dois assaltos. O representante da empresa alegou, em depoimento, que houve treinamento para situações de violência, o que não foi confirmado pelas demais testemunhas ouvidas. Tampouco foram apresentadas provas documentais para fundamentar a declaração do representante da empresa.
Segundo a juíza de primeiro grau, “o depoimento da representante (…) autoriza a conclusão de que a formação a que aludiu é apenas a comunicação do crime ao empregador”. Nessa linha, o magistrado concluiu que “resta demonstrar que o autor, como condutor, esteve diariamente exposto a situações de risco, face à necessidade diária de manusear, manter e guardar quantias em dinheiro. Não ficou satisfatoriamente comprovado que o autor recebeu treinamento para lidar com esse tipo de situação”. Na opinião do juiz, a exposição a situações perigosas, sem o recebimento de meios e procedimentos de segurança adequados, causou ao empregado danos morais, que são de responsabilidade do empregador. “Entendo que o réu deve ser responsabilizado pelos danos morais sofridos pelo autor decorrentes dos roubos que sofreu, ainda que as ações tenham sido realizadas por terceiros, pois não proporcionou ao empregado ambiente de trabalho seguro”, justificou o magistrado. Nesse sentido, o réu foi condenado ao pagamento de indenização no valor de R$ 9.750, conforme solicitado pelo autor na petição inicial.
A empresa recorreu ao TRT-RS. Para o relator do processo na 4ª Turma, desembargador João Paulo Lucena, o transporte de valores realizado pelo empregado que não possui nenhum aparato de segurança, nem treinamento que o habilite a exercer a função, minimizando os perigos dela decorrentes, constitui ato ilícito passível de responsabilidade civil. O relator justifica que a situação expõe o empregado a riscos, na medida em que ele não tem meios de prevenir infortúnios decorrentes de ação criminosa. Para o juiz, aplica-se ao caso o entendimento contido na Súmula nº 78 do TRT-RS, por analogia, que diz: “o bancário que transportar valores sem cair na hipótese prevista no art. 3º, II, da Lei n.º 7.102/83, sofre dano psicológico decorrente da atividade de risco e faz jus ao ressarcimento do dano moral”. A indenização por danos morais não é devida estritamente pelas agressões de que o autor foi vítima, mas pela situação de presumível dano psicológico a que foi submetido o reclamante, causado pela atividade arriscada de transporte de numerário”.
Quanto ao valor da indenização, a Turma decidiu reduzi-lo para R$ 5 mil, levando em consideração as circunstâncias do caso concreto, a natureza e extensão do dano, o potencial econômico do empregador, além da duração do atividade de transporte de valores e o caráter punitivo-pedagógico.
O processo também envolve outras solicitações. As juízas Ana Luiza Heineck Kruse e Maria Silvana Rotta Tedesco também participaram do julgamento. A sentença transitou em julgado, sem recurso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).
Fonte: TRT4